O racismo é um
problema social e histórico. Ele não existe porque os negros possuam qualquer
"característica de inferioridade" ou os brancos sejam
"naturalmente" opressores.
O racismo está
ligado à exploração. As classes dominantes sempre buscaram aproveitar-se das
diferenças de cor, gênero, nacionalidade, região, etc, para construir assim uma
hierarquia na exploração. Essa hierarquia ao mesmo tempo divide os explorados
em níveis diferentes de exploração (mais e menos explorados) e também justifica
que uns sejam mais explorados por… serem negros.
No Brasil, conforme
o capitalismo se estabelecia como sistema econômico, o racismo do período
escravista foi assimilado, pois isso permitia aos empresários aplicar níveis
mais intensos de exploração sobre os negros e as mulheres negras em particular,
embora desde o inicio tivesse havido inúmeras formas de resistência. No topo
dessa hierarquia de exploração encontram-se a burguesia e seus agentes: o
Estado, a mídia, a Igreja, setores da classe mais alta que incorporam os
interesses da burguesia.
Assim, a conclusão
mais importante que tiramos, mas que não é de forma alguma unânime, é que para
acabar de vez com o racismo é preciso acabar também com o capitalismo e com
toda forma de exploração do homem pelo homem.
As lutas por
mudanças mínimas, mesmo dentro do capitalismo, no sentido de questionar e
enfrentar o racismo e incorporar a população negra são fundamentais, mas devem
ser sempre consideradas como paliativos, que ainda não são a saída para o
problema do racismo. A luta pela libertação real do povo negro é parte
fundamental da luta da classe trabalhadora contra a exploração capitalista, e
portanto o racismo deve ser considerado um problema a ser discutido e enfrentado
por todos os trabalhadores, no sentido de unificar a nossa classe, com as suas
características e diversidades, contra a burguesia que, por sua vez, também tem
negros em seu meio.
Muitas correntes
políticas ou acadêmicas, ao terem um enfoque apenas limitado à questão racial,
sem um conteúdo de classe, sem abordá-la como parte da luta geral dos
trabalhadores, acabam caindo no jogo da burguesia, que muitas vezes realça a
opressão de raça apenas para silenciar sobre a dominação de classe, deixando a estrutura
social capitalista livre do combate prático-crítico e livre para aprofundar a
desigualdade e a exploração.
De fato, nos dias
atuais é ainda mais difícil concebermos um movimento de libertação real do povo
negro do racismo, sem que se enfrentem os limites do sistema capitalista – a
lógica do lucro.
O sistema
capitalista, que sobrevive cada vez mais da ajuda externa do estado, não
reserva possibilidades de melhorias efetivas e sustentáveis para a maioria da
população negra. O máximo possível dentro dos limites da lucratividade do
capital é a ascensão de uma pequena elite negra, ao mesmo tempo em que a grande
maioria permanece exatamente como estava antes.
Unir trabalhadores negros e brancos
pela emancipação geral
Impor um conjunto
de políticas efetivas de reparação para os negros requer, portanto, esforços
para ligar a luta histórica dos negros no Brasil como parte da luta do
proletariado por sua emancipação, pois o negro de hoje está também inserido no
mercado de trabalho, e justamente em posições mais exploradas. Assim, a luta
racial deve assumir também um caráter de classe e ter como preocupação a
identificação dos verdadeiros aliados e inimigos.
Não partir do
referencial de luta anticapitalista é o principal limite ao qual estão presos
aqueles setores que hoje se acomodam e aplaudem as políticas governamentais, ao
mesmo tempo se calando para o fato de que, este mesmo governo que pede
paciência aos negros é também o que cede bilhões aos banqueiros e empresários todos
os anos, mantendo justamente a exclusão da maioria.
Políticas eficazes
de reparação do racismo só poderão ser conquistadas enfrentando-se os patrões e
seus agentes: os governos de plantão.
A bandeira das
cotas proporcionais deve ser levantada, juntamente com outras políticas de
reparação, e com a luta dos demais trabalhadores por um programa geral que
responda não apenas à questão de raça, mas também à questão de classe. Esse
programa unitário de trabalhadores negros e brancos deve apontar para a ruptura
com a lógica do capital e para que os explorados – brancos e negros – se unam
para estabelecer uma forma de poder da classe trabalhadora, voltada para
enfrentar os grandes problemas sociais.
Essa unidade tão
necessária entre trabalhadores negros e brancos em sua diversidade – e que não
será facilmente alcançada, por todos os preconceitos e modelos que nos foram
impostos no decorrer de séculos – é um desafio que temos que ser capazes de
realizar na prática das lutas e de um programa global.
Nesse sentido, a
proposta de cotas deve estar inserida numa proposta mais geral de lutas do
conjunto da classe trabalhadora por emprego, moradia, saúde, educação digna e
de qualidade. Que essas questões imediatas sejam impostas mediante a luta
direta da classe como um todo. Que os resultados obtidos possam ser
estabelecidos a partir de cotas que reconheçam as desigualdades hoje existentes
e, ao mesmo tempo, lutem para superá-las. É preciso que a aliança entre os
trabalhadores negros e brancos preserve os direitos específicos de cada setor,
para que possamos enfrentar e vencer o capital e todas as formas de exploração
e opressão da humanidade.
Assim, por exemplo,
a reivindicação de que os empregos gerados pela luta sejam divididos em cotas
proporcionais, deve vir combinada com a luta pela redução da jornada de
trabalho sem redução salarial, de modo que todos os trabalhadores se beneficiem
desta mudança, através da geração dos milhões de empregos necessários. Nas
universidades públicas, do mesmo modo, a luta pelas cotas deve se juntar à luta
por mais vagas para que todos possam estudar.
É evidente que tudo
isso só poderá ser imposto mediante a luta contra os interesses capitalistas e,
em última instância, levará a uma ruptura do próprio sistema, ao questionar
qual classe deve ter o poder na sociedade, se os trabalhadores (negros e
brancos) ou a burguesia.
Somente uma
sociedade socialista no profundo sentido da palavra – de socializar os meios de
produção sob o controle e a serviço dos trabalhadores e da humanidade – é que
pode colocar um fim à exploração e à desigualdade social entre os seres
humanos, inaugurando um novo período na história humana onde tudo seja decidido
democraticamente, respeitando-se as diferenças de gênero e raça, como
diferenças físicas e não sociais.